Entre,sinta-se à vontade. Não repare as estranhezas,as belezas...

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Relógios



Duy Huynh

Olhou para a fumaça do cigarro elevando-se e tentou visualizar alguma forma capaz de distraí-lo da angustia, de esperar solitário pelo ônibus na madrugada fria. Seus pensamentos voaram com ela, percorrendo o tempo que chamava de seu. O frio, o odor do cigarro, lhe fez resgatar uma cena similar, de garoto, quando soprava por entre os dedos, aproveitando-se da neblina para fingir ser um adulto fumante, como se pudesse brincar com o tempo. Apagou a brasa, poluiu a rua, olhou sua mão e brincou, tentando fazer o contrário, no desejo desesperado do tempo voltar para trás.

Decidiu trocar o passe pelo passo, e caminhar. Até o final da noite restavam horas e sabia que suas reflexões não o deixariam dormir. Em cada passo, atentava a percepção de seus movimentos, as pernas, direita e esquerda alternando-se á frente, os braços num ritmo mais acelerado, tudo lhe soava como um tempo eterno. Denis se assustava com a relatividade do tempo como uma criança teme o barulho do trovão, quando nada pode ser feito, apenas desejar que as palavras dos mais experientes sejam capazes de aquietar aquele medo. O rapaz intrigava-se ao imaginar a imensidão de detalhes que teriam passado despercebido em seus dias. Era obcecado com a idéia de manter o controle sobre a sua vida, mas a intensidade dos fatores externos cada vez mais inibia a sua ilusão.

No passar das ruas, Denis brincava de quebra cabeça com as suas lembranças. A casa rosa da Rua 10 o transportava aquele garoto viciado em fumar neblina, que além de trapacear o tempo á frente, já olhava para trás. O pequeno Denis olhava suas fotos de bebê e se instigava, por não se parecer consigo mesmo. O Denis adolescente, como quase todas as suas partes, por vezes, pulava as casas no seu tabuleiro da memória com um sentido filosófico, não para reviver, mas refazer, resolver as lembranças, buscar a compreensão do agora a partir do outrora, a reaparição do feito e do ido.

Ele chegará à rua depois do beco, e o cheiro dali já lhe aguçavam novas velhas histórias. Havia um pé de amora, que uma hora virou amor, quando o menino teve o seu primeiro beijo. Depois daquele dia, imaginou muito o futuro. Garotas de lingerie e botas de salto alto dançando sensualmente pra ele, e o prazer.

De fato sua vida teve muitos momentos prazerosos. Mas Denis não compreendia o tempo e se perdia. Às vezes ali dentro, outras fora. Odiava quando ligava o piloto automático e depois de dias despertava assustado com o passar dos meses, sem adquirir as figuras novas pra coleção.

O rapaz ouviu o latido do seu cachorro, e percebeu já estar em casa. Deitado em sua cama, ele embora cansado, não conseguia pregar os olhos. Teimava em olhar o relógio, odiando o passar das horas. No que soava como a milésima vez, não parecia o ponteiro se pondo a girar, e sim o relógio todo. Adormeceu. Despertou com um jogo de luzes em seu rosto, e estranhamente, um som alto incomodava lhe os ouvidos. Esfregou os olhos. Estremeceu, estava de pé numa balada. Mas, era como um déjà vu, confirmado quando Natália apareceu com aquele drink de cor azul que ela havia lhe pedido. Desnorteado, pediu licença.

Denis, tonto, apagou e acordou novamente em “outro plano”. Dessa vez, numa briga com a sua mãe. E aquelas coisas não paravam, ele corria, mas ali já estava seu melhor amigo repetindo-lhe seus conselhos. E conforme corria e fugia, o amigo o insultava, com as palavras mais horríveis que nunca quis ouvir. Não havia vivido aquilo, e desejou profundamente que se um dia aquela loucura acabasse jamais quereria viver. Ofegante, sentou seguido de outra mudança. Estava ao lado do telefone, no momento antigo em que não conseguiu, mesmo sendo sua vontade, ligar pra ela. Um dos momentos em que conseguiu por tudo a perder. Agora de volta, a perca, parecia ser de si próprio.

Tontura, delírio e medo transbordavam o seu corpo. As coisas repetiam-se, criavam-se, como a cena, dele já mais velho, tocando piano num teatro lotado. Mas os diálogos mentais, as recordações e reformulações eram as notas que o perseguiam. Denis só conseguiu gritar.
O grito o transportou á um quarto, e em sua mão, percebeu uma arma. Hesitou, mas acabou por apontá-la a si e atirou.

Pensou ser o fim, mas viu sua imagem no espelho. Estava pateticamente apontando a arma feita de dedos para si. Abaixou a mão, levando ao peito, sentiu sua respiração. Sabia que agora era real. Percebeu que estava barbudo, mas não sabia quanto tempo havia passado, mas já não importava mais. O único tempo que almejava, era o de recomeçar.

2 comentários:

  1. Há dias que você apenas deseja que passe rápido, e de fato dias, semanas, meses se passam, e nem vi, são momentos de morte enquanto vivo.

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